A relação entre educação, emprego e salários em Portugal
Os investimentos em educação trazem benefícios muito significativos para os indivíduos e para a sociedade em geral.
As evidências apontam para uma relação entre níveis de educação mais elevados e melhores perspetivas de emprego, um salário superior, uma carreira mais estável, maior satisfação no trabalho e melhores condições de trabalho.
Mas os benefícios da educação não se limitam ao indivíduo que a completa; estendem-se aos colegas de trabalho, à produtividade e inovação de empresas, até à geração seguinte.
Os estudos confirmam o que o bom senso sugere: países com população mais instruída e com níveis de competências mais elevados desfrutam de um maior crescimento e desenvolvimento económico.
Desigualdades na participação e resultados da educação
Estes benefícios generalizados são uma das razões para o financiamento público da educação e para a existência da escolaridade mínima obrigatória.
No entanto, há desigualdades no acesso à educação e formação, na conclusão de níveis de educação e nos resultados educativos, sendo consensual que o fator central que determina estas desigualdades é o contexto socio-económico.
Já aos 15 anos, as competências básicas dos alunos portugueses são fortemente associadas ao contexto socioeconómico familiar. Portugal encontra-se entre os países da OCDE em que esta correlação é mais forte. Mais à frente no percurso formativo, os estudantes de famílias com menos qualificações estão sub-representados entre os inscritos no ensino superior. Enquanto que 78% da população entre os 18 e os 24 anos têm pais sem formação no ensino superior, estes representam apenas 61% dos novos inscritos nas universidades e politécnicos.
E já na força de trabalho, os adultos com menos qualificações são os que menos participam em ações de formação ao longo da vida. A diferença de participação neste tipo de formação, entre os adultos que completaram o ensino superior e os que apenas concluíram o ensino secundário foi, em 2019, de 10 pontos percentuais. E a diferença para os que não concluíram o ensino secundário ascende a 17 pontos percentuais. Quanto mais educados, mais procuramos a educação.
A importância de alargar o acesso à aprendizagem no contexto atual
Num mercado de trabalho em constante mudança, é essencial garantir que todos têm acesso a oportunidades de aprendizagem que lhes permitam ter perspetivas de carreira e de vida mais promissoras.
As grandes tendências mundiais no mercado de trabalho como progresso tecnológico, globalização, novos modelos de organização e formas de trabalho, alteram substancialmente as competências exigidas aos trabalhadores, arriscando deixar para trás uma parte significativa da força de trabalho com competências obsoletas ou desnecessárias.
A OCDE estima que, como resultado da automação, 14% do emprego nos países desenvolvidos pode sofrer mudanças muito significativas ou até desaparecer por completo. Adicionalmente, 32% do emprego está associado a profissões que vão requerer competências significativamente diferentes das que são exigidas atualmente.
Para Portugal, o estudo recente da NovaSBE e da CIP estima que 50% do tempo de trabalho é passado em tarefas que podem ser automatizadas com tecnologia já existente atualmente, um valor que pode subir para 67% em 2030.
No entanto, o progresso tecnológico e outras tendências também criam novos empregos. Para Portugal, estima-se que pelo menos 600 mil novos empregos serão criados até 2030 como resultado do envelhecimento da população, progresso tecnológico e outras tendências.
O grande desafio é que os empregos criados são substancialmente diferentes dos mais afetados ou destruídos, pelo que não poderão ser executados pelos mesmos trabalhadores, a não ser que reconvertam as suas competências. De facto, a tecnologia afeta as ocupações com tarefas manuais, enquanto que as mais importantes com o progresso tecnológico são tarefas que exigem competências sociais, cognitivas e complexas.
A necessidade de adquirir e reconverter competências
O potencial de indivíduos, empresas e economias colherem os benefícios destas mudanças estruturais depende da capacidade do sistema de atrair as pessoas que necessitam de desenvolver competências. Neste contexto, importa atuar sobre duas faixas etárias principais.
- Garantir que ninguém deixa de adquirir qualificações mais elevadas devido a barreiras que possam enfrentar. De acordo com a OCDE, há necessidade de alargar o acesso ao ensino superior em Portugal, promovendo inscrições entre adultos e alunos do ensino vocacional, e reformando o sistema de apoio financeiro aos alunos.
- Para melhorar as suas perspetivas de empregabilidade, é essencial proporcionar oportunidades de aprendizagem aos adultos que já se encontram no mercado de trabalho mas cujas competências estão em risco de se tornar obsoletas. Em Portugal, existem cerca de 4,5 milhões de indivíduos entre 25 e 64 anos e 48% deles não concluíram o ensino secundário. Na mesma faixa etária, apenas 10% participaram em ações de formação, formal ou não formal. E, de acordo com a OCDE, os trabalhadores mais ameaçados pela automação têm menor probabilidade de participar em ações de formação do que trabalhadores em profissões menos automatizáveis.
Portanto, a escala do problema é enorme e é provável que aumente devido ao progresso tecnológico, à atual crise pandémica e à incerteza sobre o seu desenvolvimento. Já em 2019, no mesmo relatório, a OCDE alertava que, entre os 34 países analisados, Portugal é o país onde é mais urgente preparar o sistema de aprendizagem de adultos para o futuro.
Barreiras à participação em educação e formação
Para promover a partipação na aprendizagem, importa perceber as principais barreiras que os indivíduos enfrentam.
Em 2016, os adultos portugueses que gostariam de participar em educação ou formação mas que acabaram por não o fazer, apontaram vários motivos para a sua não participação: questões relacionadas com horário (41%), custos financeiros (32%), motivos familiares (31%), falta de apoio do empregador ou serviços públicos (24%) e falta de oferta de formação adequada (18%).
Entre os alunos mais jovens, a barreira financeira é a mais comum. Em 2017, 41% dos estudantes que abandonaram o ensino superior tomaram essa decisão por razões financeiras.
Além disso, após a crise no ínicio da última década, as matrículas no ensino superior em Portugal caíram cerca de 12% entre 2011 e 2015, sugerindo que condições familiares económicas frágeis podem prejudicar as perspectivas de uma parte substancial das gerações mais jovens. Uma situação que, infelizmente, pode repetir-se nos próximos anos.
Estratégias para mitigar restrições financeiras
São várias as estratégias e políticas públicas para mitigar as restrições financeiras, principalmente no que diz respeito à participação no ensino superior. A maioria passa por apoiar a família do aluno através de benefícios fiscais ou subsídios ou por apoiar diretamente o aluno com bolsas de estudo que podem ou não depender do mérito do aluno e das suas condições sócio-económicas.
Outra estratégia retomada em 2018 para promover a partipação no ensino superior é a “Linha de Crédito para Estudantes do Ensino Superior com Garantia Mútua”, através da qual estudantes têm acesso a crédito para financiar os seus estudos com melhores condições junto do sistema financeiro e em que o Estado é fiador do empréstimo.
Noutros países existem formas de apoio aos alunos que passam por “income share agreements”.
Income Share Agreements (ISA) – um programa de apoio à educação e formação que protege o estudante
Os ISA (acordos de partilha de rendimentos, numa tradução literal) são contratos de apoio à formação com características muito particulares.
Primeiro, os alunos começam a fazer pagamentos apenas quando os seus rendimentos estiverem acima de um limite mínimo estabelecido no contrato. Segundo, é também estipulada no contrato a percentagem máxima do rendimento a pagar para garantir que o rendimento do aluno após o pagamento lhe permite manter um nível de vida adequado. Deste modo, os ISA protegem o aluno caso venha a receber um rendimento baixo no futuro e garante que o esforço de pagamento é proporcional ao rendimento.
Os ISA estão implementados como política pública em vários países (Austrália, Nova Zelândia, África do Sul, Inglaterra, País de Gales, Húngria, Coreia do Sul, Holanda e Malásia). Noutros países, como nos E.U.A., os ISA são providenciados diretamente por instituições de ensino, por capital privado ou por organizações sem fins lucrativos.
Nos últimos anos, assistiu-se a uma crescente participação de entidades filantrópicas no financiamento de ISAs uma vez que são considerados como um investimento com grande potencial de impacto ao apoiarem estudantes que de outra forma não acederiam a oportunidades de aprendizagem.
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À luz dos atuais desafios no mercado de trabalho, soluções inovadoras de programas de apoio aos estudos, como os ISA, devem ser considerados não só para alunos do ensino superior, mas também, alargados a adultos que queiram ou necessitem de reconverter as suas competências.